283 - TJRJ. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL CONFIGURADO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. RECURSO DO RÉU DESPROVIDO E RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
Ação ajuizada por beneficiário previdenciário contra instituição financeira, objetivando a declaração de nulidade de contrato de empréstimo consignado não contratado, a inexistência de débito, a devolução em dobro dos valores descontados e a reparação por danos morais.
O Autor alega que nunca abriu conta corrente ou contratou empréstimo com o Réu, indicando a realização de fraude mediante utilização de documentos falsos.
A sentença julgou procedentes os pedidos, declarando a inexistência do contrato e do débito, condenando o banco à devolução em dobro dos valores descontados e ao pagamento de R$ 6.000,00 por danos morais.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
Há três questões em discussão: (i) definir se estão presentes os requisitos para manutenção da gratuidade de justiça concedida ao Autor; (ii) verificar a existência de falha na prestação do serviço bancário e a responsabilidade do réu pelos danos causados; (iii) analisar a adequação do quantum fixado a título de danos morais e da condenação à devolução em dobro dos valores descontados.
III. RAZÕES DE DECIDIR
Mantém-se a gratuidade de justiça concedida ao Autor, pois o Réu não demonstrou elementos capazes de afastar a presunção legal de necessidade, conforme CPC, art. 99, § 3º e jurisprudência consolidada.
Rejeita-se a preliminar de ilegitimidade passiva, aplicando-se a teoria da asserção, uma vez que o Autor indicou a instituição financeira como responsável pela violação de seus direitos.
Configura-se a responsabilidade objetiva do banco Réu, nos termos do CDC, art. 14, uma vez que não comprovou a regularidade do contrato de empréstimo supostamente firmado e deixou de demonstrar a inexistência de falha em seus sistemas de segurança.
O evento danoso, consistente na realização de empréstimo fraudulento vinculado à conta aberta em (Cárceres - MT), e com documentos falsos, enquadra-se como fortuito interno, caracterizando risco do empreendimento, conforme Súmula 479/STJ.
O dano moral está configurado em razão da indevida contratação e dos descontos realizados sobre o benefício previdenciário do Autor, o que ultrapassa o mero aborrecimento. O valor de R$ 6.000,00 foi mantido, observando-se os critérios de proporcionalidade e razoabilidade.
Correta a condenação à restituição em dobro dos valores descontados, independentemente de má-fé do Réu, em conformidade com o art. 42, parágrafo único, do CDC e entendimento do STJ (EAREsp. Acórdão/STJ).
Determina-se, contudo, que os juros de mora sobre os danos morais fluam a partir do evento danoso (primeiro desconto indevido), nos termos do art. 398 do CC e Súmula 43/STJ e Súmula 54/STJ, enquanto a correção monetária incidirá a partir da publicação da sentença, em conformidade com a Súmula 362/STJ.
IV. DISPOSITIVO E TESE
Recurso do Réu desprovido. Recurso Adesivo do Autor parcialmente provido para ajustar o termo inicial dos juros de mora e manter, no mais, a sentença de primeiro grau. Honorários advocatícios majorados para 12% sobre o valor da condenação, nos termos do CPC, art. 85, § 11.
Tese de julgamento: A concessão da gratuidade de justiça presume-se verdadeira mediante declaração firmada pelo requerente, cabendo à parte contrária o ônus de afastá-la com prova idônea.
O banco é responsável, objetivamente, por danos decorrentes de fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, em razão da aplicação da Teoria do Risco do Empreendimento.
A restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente independe da comprovação de má-fé, bastando a demonstração de cobrança contrária à boa-fé objetiva.
Dispositivos relevantes citados: CF/88, art. 5º, XXXV e LXXIV; CDC, arts. 2º, 3º, 14 e 42, parágrafo único; CC, art. 398; CPC, arts. 3º, 85, §11, 99, §3º e 373, II.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas 43, 54, 297, 362 e 479.TJ/RJ, Súmulas 43 e 97; TJ/RJ, APL 0255590-14.2016.8.19.0001, Rel. Des. Werson Franco, j. 29/06/2023; TJ/RJ, APL 0012156-20.2021.8.19.0021, Rel. Des. Maria Luiza de Freitas, j. 26/03/2024.
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