425 - TJRJ. Mandado de segurança em matéria penal manejado contra decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal Especializada da Comarca da Capital, a qual determinou a quebra do sigilo dos dados telemáticos de usuários da Google. Impetrantes que buscam a concessão da ordem, para que seja anulado o item referente à quebra do sigilo telemático. Alegação de que parte da decisão impugnada é genérica, violadora de direito constitucionais e legais (arts. 5º, X, XII, LVII e LIV, da CF, Lei 9.296/96, Resolução 58/2008 do CNJ, e Decreto 8.771/2016) , desproporcional, desnecessária e que não preenche os requisitos exigidos para a quebra dos sigilos. Hipótese que teve origem na representação, feita nos autos do IP 015-03357/2024, pela Autoridade Policial e ratificada pelo Ministério Público, visando a quebra do sigilo telemático de todos os usuários dos serviços prestados pela Empresa Google que tenham, no dia 23.06.2024, pesquisado os nomes de Gabriel de Andrade Bergamo e de Maria Tavares de Mello Bergamo. Inquérito policial que versa sobre as investigações realizadas para identificar os demais integrantes de organização criminosa formada por W. L. da S. e R. W. da S. supostos autores dos crimes de roubo, extorsão e furto, praticados mediante emprego de arma de fogo e restrição da liberdade das vítimas, no 23.06.2024, em uma residência no Jardim Botânico, Rio de Janeiro. Investigações policiais sinalizando a existência de uma organização criminosa, estruturalmente organizada e oriunda do Estado de São Paulo, que vem apavorando moradores da Zona Sul do Rio de Janeiro, ao praticar diversos e consecutivos roubos à residência, em especial, nos bairros da Lagoa, Ipanema, Leblon e Copacabana. Peças policiais também indicando a imprescindibilidade das medidas cautelares requeridas para a identificação e a captura de todo o bando criminoso. Espécie dos autos que comporta solução meramente terminativa. Mandado de segurança que se traduz como autêntica ação de natureza cível e mandamental, destinada a resguardar direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, «sempre que, legalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça» (Lei 12.016/09, art. 1º; cf. tb. CF, art. 5º, LXIX). Obstáculo que se ora se antepõe ao julgamento de mérito, por conta da inexistência de legitimação ativa da Empresa-Impetrante para, em nome próprio, impetrar mandado de segurança alheio, visando preservar a higidez e titularidade de dados que pertencem exclusivamente a terceiros - seus usuários-clientes (Lei 13709/18, arts. 1º e 17). Inexistência do fenômeno coincidência entre as titularidades do direito material e do direito processual de agir, repercutindo na questão da legitimidade ad causam ativa. Preceptivos dos arts. 17 («para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade») e 18 do CPC («ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico»). Inexistência de exceção prevista no Ordenamento Jurídico (CF, LGPD ou Diploma correlato), capaz de outorgar, à Empresa-Impetrante, uma excepcional autorização de agir em juízo em casos como tais, valendo realçar que a exceção mencionada pelo art. 18, in fine, tem que ser expressa, visto que, por elementar regra de hermenêutica, as normais excepcionais se interpretam restritivamente. Simples condição de depositária dos dados respectivos que não confere à Empresa-Impetrante a pertinência subjetiva necessária para, em juízo, se opor às requisições judiciais advindas da persecução penal do Estado, sobretudo quando, em situações como a presente, os titulares desses direitos sequer estão identificados, embora identificáveis. Postura empresarial que procura se travestir, ilegitimamente, numa espécie de tutora universal e absoluta dos direitos fundamentais alheios, em prepotente posição de tentar dizer o direito até mesmo em face dos órgãos do Poder Judiciário, numa usurpação enviesada das atribuições jurisdicionais que constitucionalmente pertencem a este último (CF, art. 5º, XXXV; CPC, art. 16 c/c CPP, art. 3º). Investida mandamental que, bem ao reverso da posição de baluarte dos valores constitucionais, se acha, na verdade, animada por interesses meramente corporativos privados (Big Techs), buscando, progressivamente e a todo custo, se livrar dos balizamentos normativos vigentes e se posicionarem imunes às contenções impostas pelo Poder Judiciário (STJ). Inviabilidade de uma empresa privada formular, ao seu nuto e em detrimento dos legítimos interesses do Estado soberano, juízos negativos sobre o ritmo, forma, pertinência, conteúdo, extensão, motivação, conveniência, limites, relevância e proporcionalidade (questionamentos, todos, feitos pela inicial) em face do objeto das investigações penais oficiais (fatos criminosos e respectiva autoria), sobretudo quando sufragadas por decisão judicial advinda de autoridade competente. Relevantes questões jurídicas suscitadas pela inicial que decerto exibiriam espaço de discussão pertinente num ambiente doutrinário e acadêmico ou, quando muito, em ação de natureza objetiva, proposta perante quem de direito, ou, até mesmo em demanda de natureza subjetiva, mas proposta pelos sujeitos verdadeiramente legitimados. Natural ansiedade pelo enfrentamento dessas intrigantes questões que não resistem, contudo, à realidade do presente feito, à depuração prévia das indispensáveis condições da presente ação individual, cujo exame, preliminar, frente ao direito material controvertido, sabidamente antecede e prejudica o enfrentamento do mérito (Lei 12016/09, art. 10; CPC, art. 16, 17 e 330, II, e CPC, art. 485, VI). Indeferimento da inicial, por ilegitimidade ad causam ativa (Lei 12016/09, art. 10; CPC, art. 16, 17 e 330, II, e CPC, art. 485, VI).
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