901 - TJRJ. Apelação Criminal. LAION DE SOUZA BRITO foi condenado pelo cometimento do crime previsto no art. 33, na forma da Lei 11.343/06, art. 40, IV, a 9 (nove) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime fechado, e 933 (novecentos e trinta e três) dias-multa, no menor valor unitário, sendo mantida a sua prisão. Recurso ministerial, pugnando pela condenação do acusado também pela prática do crime descrito na Lei 11.343/06, art. 35. Recurso da defesa, postulando a absolvição, por ser frágil a prova obtida em desfavor do recorrente, com indícios da ocorrência de ilicitude da busca domiciliar, com base em denúncia anônima e, alternativamente: a) a exclusão da majorante relativa ao emprego de arma de fogo; b) a revisão da dosimetria. Parecer da Procuradoria de Justiça no sentido do conhecimento e parcial provimento do recurso para não elevar a sanção considerando a circunstância agravante da reincidência. 1. Aduz a denúncia que em 20/12/2022, o acusado guardava para fins de tráfico 105 g de COCAÍNA, acondicionados em embalagens plásticas, 02 pistolas, 08 carregadores e 37 munições. A prisão do denunciado foi possível porque policiais militares receberam informação de que haveria criminosos na Rua Jordão, 204. Lá, um dos moradores franqueou a entrada dos policiais e estes tiveram suas atenções voltadas para o acusado, que tentava fugir do local pulando a janela da casa. Os agentes de segurança, ao abordá-lo, encontraram, em sua posse, uma mochila com os materiais ilícitos acima detalhados. O acusado, ainda, a partir de data que não se pode precisar, mas até a data da sua prisão, associou-se a outros indivíduos não identificados, de forma estável e permanente para fins de praticar tráfico de drogas na localidade do Jordão. 2. O pleito absolutório merece ser acolhido. 3. Depreende-se dos autos que foi apreendida razoável quantidade de drogas, duas pistolas e munições, mas não restaram claras as circunstâncias do ingresso dos militares na moradia do acusado. 4. Conquanto admissível a prolação de uma sentença condenatória com base nos depoimentos dos agentes da Lei, a hipótese é de dúvida quanto à legalidade da ação dos militares que, sem mandado e motivos justificáveis, ingressaram na sua residência e apreenderam materiais ilícitos. 5. Segundo os depoentes militares, eles foram noticiados de que havia armas na residência onde ocorreu o fato. Lá foi franqueado o ingresso e as buscas, sendo arrecadadas drogas e armas no interior de uma mochila, embaixo da cama, no quarto onde se encontravam o acusado e mais duas moças (testemunhas). 6. Compartilho do posicionamento dos Tribunais Superiores, no sentido de que a denúncia anônima de um suspeito, por estar na posse de material ilícito, não é elemento apto a autorizar a entrada dos militares em casa alheia. Eventual confissão do fato, ou até a permissão para ingresso e revista na moradia não foi ratificada em juízo. Não há evidências de que foi expressa de forma livre e espontânea. Ademais, os militares não mencionaram que visualizaram atividade de movimento de venda de drogas, ou de outra atividade ilícita no local, tampouco no entorno onde estava o apelante, nem mesmo verificaram algum ato suspeito no imóvel. 7. Com efeito, não se infere que havia prévio conhecimento de que estava ocorrendo crime na aludida residência. O encontro do material ilícito não torna válida a diligência. 8. Cabia aos policiais antes da abordagem, no mínimo, observarem o lugar para obterem provas mais robustas de que na casa estava ocorrendo algum crime. Nada justifica que os agentes da lei extrapolem a sua atribuição, passando ao largo de garantias constitucionais, notadamente a prevista no CF/88, art. 5º, XI que consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. 9. Ademais, como notório, os agentes de segurança costumam atuar com certa truculência quando abordam pessoas que moram em comunidades, e muitas vezes, em desacordo com os mandamentos legais e constitucionais, portanto, é imperativa uma análise cuidadosa dos fatos narrados. 10. Concessa máxima vênia, a diligência realizada mostrou-se confusa. Subsistem dúvidas quanto à prática do delito apurado, eis que toda a prova decorre de uma conduta inicial com indícios de haver passado ao largo das formalidades legais e constitucionais. Somado a isso, verifico que não restou indubitável que o material arrecadado pertencesse também ao acusado. Isso porque não há prova irrefragável de que o material proibido estava na posse do acusado. Segundo testemunhas presenciais, o denunciado estava lá de passagem, havia várias pessoas na casa onde ocorreram as buscas e quem morava lá se evadiu pela janela, antes dos policiais adentrarem no quarto, onde encontraram as drogas e artefatos bélicos, especificamente em uma mochila embaixo da cama. 11. Em um estado democrático de direito não há margem para uma condenação criminal, com base em suposições, incertezas ou ações ilegais ou em descompasso com os mandamentos constitucionais. 12. Em tal contexto, aplicável o princípio in dubio pro reo, impondo-se a absolvição do recorrente quanto ao crime que lhe foi atribuído. 13. Igualmente, não há prova de que o acusado estava associado a outrem com vínculo de permanência e estabilidade. Assim, não merece prosperar o pleito ministerial. 14. Recursos conhecidos, negando provimento ao ministerial e dando provimento ao defensivo, para absolver o recorrente LAION DE SOUZA BRITO do delito a si imputado, com fulcro no CPP, art. 386, VII. Expeça-se o respectivo Alvará de Soltura e oficie-se.
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