98 - TJRJ. Apelação criminal defensiva. Condenação por furto qualificado pelo rompimento de obstáculo. Recurso defensivo que não questiona a higidez do conjunto probatório, gerando restrição ao thema decidendum. Irresignação que busca a absolvição por atipicidade material da conduta (princípio da insignificância) ou a absolvição pelo reconhecimento do estado de necessidade (furto famélico) e, subsidiariamente, o afastamento da qualificadora do rompimento de obstáculo, por ausência de perícia, a fixação da pena-base no mínimo legal ou a redução do aumento, o afastamento da agravante da reincidência, seja por bis in idem, seja por ausência de certidão cartorária atestando a existência de condenação pretérita, ou, ao menos, a diminuição do quantum de aumento, a aplicação da atenuante da confissão, afastando-se a Súmula 231/STJ ou operando-se a integral compensação com a agravante da reincidência, a incidência do privilégio (CP, art. 155, §2º) em sua escala máxima, o estabelecimento do regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou a suspensão condicional da pena. Mérito que se resolve parcialmente em favor da Defesa. Princípio da insignificância que pressupõe, grosso modo, nos termos da jurisprudência do STJ: (1) lesão patrimonial inferior a 10% do salário mínimo; (2) ausência de violência ou grave ameaça; (3) não ser o injusto qualificado, tendo em conta sua maior reprovabilidade; e (4) réu primário, de bons antecedentes e sem o registro de inquéritos ou ações em andamento tendentes a caracterizar o fenômeno da «habitualidade delitiva», «notadamente na prática de crimes contra o patrimônio, o que demonstra o seu desprezo sistemático pelo cumprimento do ordenamento jurídico» (STJ). Ainda que não exista o laudo indireto da res furtiva, o Apelante não preenche os requisitos 03 e 04, tendo em conta que o furto foi praticado mediante arrombamento (cf. prova testemunhal) e o Acusado é portador de maus antecedentes e duplamente reincidente. Espécie dos autos rigorosamente incompatível com a alegação de furto famélico, não só porque incomprovados seus requisitos conformadores, com ônus a cargo da Defesa (CPP, art. 156), mas sobretudo porque, apesar de se tratar de furto de gêneros alimentícios, o Acusado confessou informalmente aos policiais que já havia vendido parte dos bens subtraídos. Qualificadora de destruição ou rompimento de obstáculo caracterizada, haja vista a atuação do Acusado, comprovada por prova testemunhal, na superação da proteção posta sobre a coisa, visando impedir ou dificultar a atividade subtrativa, ciente de que «excepcionalmente, se cabalmente demonstrada a escalada ou o rompimento de obstáculo por meio de outras provas, o exame pericial pode ser suprido, mantendo-se assim as qualificadoras.» (STJ). Juízos de condenação e tipicidade mantidos. Dosimetria que comporta ajuste. Tópico relacionado à culpabilidade que não restou suficientemente fundamentado, impondo sua exclusão. Salvo quando extrapolantes dos limites já valorados pelo legislador quando da formulação do tipo penal, não se pode invocar, a título de consequências do crime, para majoração da pena-base, os naturais resultados danosos detectados a partir da prática de crime contra o patrimônio imputado. Valoração negativa da rubrica «personalidade» que reclama, para efeito de recrudescimento da pena-base, base probatória idônea e específica, fundada em elementos concretos dispostos nos autos. Rubrica relacionada à conduta social que também apresentou fundamentação insuficiente e merece ser afastada. Acusado que ostenta 04 condenações irrecorríveis, sendo as anotações 02 e 10 configuradoras de maus antecedentes e as de 03 e 06 forjadoras da reincidência. Viabilidade da comprovação do trânsito em julgado que caracteriza os maus antecedentes e a reincidência através da análise depurativa de documentos que o evidenciam ou pela consulta ao site do Tribunal (STJ). Repercussão das condenações irrecorríveis que não caracteriza a odiosa prática do bis in idem. Legítima avaliação legal (CP, art. 59) sobre o histórico e o perfil do agente, a fim de destinar-lhe, segundo a escala penal do novo crime praticado, a proporcional e adequada resposta penal, fazendo parte do processo de individualização da pena, o qual tem status constitucional e, por essa razão, legitima esse procedimento avaliatório (CF, art. 5º, XVVI). A questão já foi inclusive tratada inúmeras vezes, tanto diante dos maus antecedentes quanto em face da reincidência, fixando-se a diretriz final de «apenas valorar negativamente a escolha efetuada pelo agente em voltar a delinquir, do que resulta maior juízo de censura em relação a nova conduta praticada, e não uma nova punição em relação ao crime pretérito» (STF). Daí também não se cogitar de eventual «bis in idem» (STJ). Firme orientação do STJ no sentido de se quantificar, nas primeiras fases de depuração, segundo a fração de 1/6, sempre proporcional ao número de incidências, desde que a espécie não verse (como é o caso) sobre situação de gravidade extravagante. Aumento de 2/6 pelas anotações 02 e 10 na pena-base que se impõe. Compensação proporcional entre a atenuante da confissão e uma das anotações forjadoras da reincidência (STJ), ensejando a remanescente novo aumento segundo a fração de 1/6. Inviabilidade da concessão de sursis, restritivas ou privilégio (CP, arts. 44, 77, 155, §2º), considerando a recidiva do Réu. Regime prisional que há de ser depurado segundo as regras do CP, art. 33, optando-se, na espécie, pela modalidade semiaberta, considerando o volume de pena, a reincidência do Réu e a disciplina da Súmula 269/STJ. Tema relacionado à execução provisória das penas que, pelas diretrizes da jurisprudência vinculativa do STF (ADCs 43, 44 e 54), não viabiliza a sua deflagração a cargo deste Tribunal de Justiça. Situação dos autos que, todavia, não se insere nessa realidade. Acusado que já se encontrava preso por força de decreto de prisão preventiva, cujos termos, hígidos e vigentes ao longo da instrução, foram ratificados por ocasião da sentença condenatória, alongando sua eficácia. Daí a orientação do STF no sentido de que, se «o réu permaneceu preso durante toda a instrução criminal, não se afigura plausível, ao contrário, revela-se um contrassenso jurídico, sobrevindo sua condenação, colocá-lo em liberdade para aguardar o julgamento do apelo» (STF). Custódia prisional mantida, reeditando os fundamentos do decreto restritivo inaugural, agora ancorada por regime prisional compatível com a segregação (STJ), sendo inaplicável a Resolução CNJ 417/21, dada a condição de preso do Acusado. Apelo defensivo a que se dá parcial provimento, a fim de redimensionar as sanções finais para 03 (três) anos, 01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, além de 15 (quinze) dias-multa, no valor mínimo legal.
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