TJRJ. APELAÇÃO. arts. 155 §4º II E 157 §1º E §2º VII C/C 14 II N/F 69 TODOS DO CP. RECURSO DEFENSIVO PRETENDENDO A DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE FURTO, A EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA DE ABUSO DE CONFIANÇA, A REDUÇÃO DA PENA PELA TENTATIVA EM SEU PATAMAR MÁXIMO DE 2/3 (DOIS TERÇOS), A APLICAÇÃO DA DETRAÇÃO E A FIXAÇÃO DO REGIME PRISIONAL MAIS BRANDO.
Emerge dos autos que no dia 12 de agosto de 2022, em horário não precisado, no interior da residência situada na Estrada do Cabuçu, 482, Campo Grande, nesta comarca, a recorrente, aproveitando-se de estar trabalhando como faxineira no local, onde já fazia faxinas há cerca de três anos, subtraiu, para si, a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) em espécie, os quais estavam guardados embaixo da pia do banheiro do quarto da lesada Rafaela Vieira Pestana. Três dias depois, no interior da citada residência, quando estava realizando outra faxina na casa, a denunciada, livre e conscientemente, tentou subtrair, para si, a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em espécie, pertencentes à mesma vítima, sendo surpreendida por esta. A fim de garantir a impunidade do crime e a posse do dinheiro ameaçou a vítima com uma faca. Contudo, a vítima, aproveitando-se de um momento em que a apelante largou a faca, entrou em luta corporal com esta, conseguiu dominá-la e acionou a polícia civil, sendo que com a chegada de policiais da 35ª DP ao local, a apelante os levou à sua residência, onde seu companheiro entregou-lhes o dinheiro subtraído no furto anterior. A materialidade delitiva vem estampada pelo auto de prisão em flagrante (pasta 22); o registro de ocorrência (pasta 16); o auto de apreensão (pata 19); o auto de entrega (pasta 21), além da prova oral produzida em sede policial e em juízo. Ao contrário do sustentado pela defesa técnica, a prova não é frágil, estando a condenação pelos crimes de roubo e furto amparada em conjunto probatório convincente, robusto e suficiente, no qual restaram amplamente demonstradas a materialidade e a autoria. O depoimento da vítima em conjunto com os das demais testemunhas de acusação evidenciou a prática do crime de furto, vez que a recorrente, que era faxineira no local, subtraiu, para si, a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais), em espécie, os quais estavam guardados em uma sacola plástica embaixo da pia do banheiro do quarto da lesada Rafaela Vieira Pestana. Além disso, o delito de roubo também restou demonstrado, tendo a vítima narrado que se deparou com a apelante no banheiro da suíte com uma das sacolas de dinheiro na mão, contendo a quantia de R$10.000,00 (dez mil reais) e que, após ser flagrada, sacou uma faca tentando se evadir, mas foi contida pela própria vítima que entrou em luta corporal com a recorrente. No caso em tela, verifica-se que a autoria delitiva dos crimes encontra respaldo no relato da vítima, que reconheceu a apelante, e pelas declarações das testemunhas e dos policiais que registraram a ocorrência. Embora a apelante tenha negado as subtrações, alegando ter sido torturada para confessar a prática dos crimes, tal versão se mostra isolada nos autos. Nesse sentido, é certo que as lesões descritas no laudo do index 039 e no BAM do index 041 se mostram compatíveis com a luta corporal travada pela recorrente e pela vítima, tornando verossímil a versão apresentada por esta. Além disso, a vítima deixa clara a grave ameaça exercida com uma faca pela recorrente para garantir o valor que estava sendo subtraído, não assistindo razão à Defesa ao pugnar pela desclassificação do delito de roubo para o de furto. Com efeito, a apreensão e a perícia da arma empregada na prática do roubo são prescindíveis, quando presentes outros elementos probatórios de seu efetivo uso no crime para intimidar as vítimas, traduzido, na maioria das vezes, pelos seus depoimentos. A palavra da vítima, como consabido, nos crimes contra o patrimônio assume caráter probatório preponderante (TJERJ, Rel. Des. Suimei Cavalieri, 3ª CCrim, ApCrim 349003-19/09, julg. em 24.04.12). Da mesma forma, presente a qualificadora de abuso de confiança em relação ao crime de furto. A apelante tinha acesso ao interior da residência da vítima, pois realizava faxina de forma rotineira. O fato de possuir ou não as chaves do domicílio em questão não é o único elemento a demonstrar a confiança depositada na recorrente, vez que gozava de boa referência para os empregadores que a contratavam frequentemente. Neste sentido o entendimento do E. STJ (HC 192.922/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 28/2/2012, DJe de 7/3/2012.). Logo, correta a condenação da apelante tanto pelo crime de furto qualificado pelo abuso de confiança, quanto pelo crime de roubo majorado tentado, ambos narrados na denúncia. Passa-se a análise da dosimetria da pena. As penas referentes ao delito previsto no art. 155, § 4º, II do CP foram fixadas nos mínimos legais, em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, não merecendo reparo. No que tange ao art. 157, §1º e § 2º, VII, c/c art. 14, II; ambos do CP, a primeira fase a sentença recorrida aplicou as penas-base nos mínimos legais em 4 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo, mantida na segunda fase, pois ausentes circunstâncias agravantes ou atenuantes. Na terceira fase, presente a causa de aumento prevista no, VII do §2º do CP, art. 157. Com isso, a sanção imposta ao crime de roubo se eleva em 1/3 (um terço), ao patamar 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Presente, ainda, a causa de diminuição de pena pela tentativa. Correta a fração de redução de 1/3 (um terço) empregada pelo Juízo a quo, pois a recorrente foi flagrada com o dinheiro em mãos, tendo o iter criminis sido percorrido em grande parte, não se consumando o delito por questões de minutos quando a apelante sairia da casa, mas foi surpreendida com o retorno repentino da vítima à residência. Assim a pena para o crime de roubo atinge o patamar de 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 08 (oito) dias-multa. Tendo em vista o concurso material de crimes a sanção final se consolida em 5 (cinco) anos, 06 (seis) meses e 20 (vintes) dias de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa. O regime semiaberto é o adequado e suficiente a garantir os objetivos da pena, tendo em vista o quantum de pena imposto e as circunstâncias judiciais positivas, nos termos do art. 33 §2º, «b» e §3 do CP. No tocante à detração do tempo de prisão cautelar cumprido pelo apelante até a data da sentença para fins de mitigação de regime nos termos do § 2º do CPP, art. 387, observa-se que a instância de revisão não dispõe do aparato necessário à aferição das condições objetivas e subjetivas inerentes a este procedimento, razão pela qual cuida-se de pleito que deverá ser endereçado ao Juízo da Execução, que dispõe da expertise, staff habilitado e demais elementos necessários a tanto. A jurisprudência deste órgão fracionário tem se orientado no sentido de reservar tal atividade exclusivamente ao Juiz da VEP (0201830-48.2019.8.19.0001 - APELAÇÃO. Des(a). CLAUDIO TAVARES DE OLIVEIRA JUNIOR - Julgamento: 14/06/2023 - OITAVA CÂMARA CRIMINAL). Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, vez que o crime foi praticado com violência ou grave ameaça, encontrando óbice no disposto no art. 44, I do CP. Impossível, também, a aplicação do sursis em função da elevada pena imposta. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO, na forma do voto do Relator.
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