TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. LEI 11.343/06, art. 33, CAPUT. RECURSO DEFENSIVO QUE PLEITEIA: 1) O RECONHECIMENTO DA NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA; 2) A ABSOLVIÇÃO POR FRAGILIDADE DO LASTRO PROBATÓRIO; 3) REDUÇÃO DA PENA NA PRIMEIRA FASE DE DOSIMETRIA; 4) FIXAÇÃO DE REGIME PRISIONAL MAIS BRANDO.
Inicialmente, não há que se falar em nulidade processual, por suposto cerceamento de defesa, diante do indeferimento do pedido de juntada de prova de que o apelante havia se submetido a cirurgia reparadora de malformação em uma das orelhas anos antes dos fatos, malformação esta que teria sido motivo para dispensa do reconhecimento fotográfico do recorrente em sede policial. Isso porque, o apelante quedou-se inerte diante do indeferimento do requesto, deixando de impugnar o ato a tempo e modo, conforme se observa da assentada de index 87586657. Decorre que a arguição neste momento processual, configura a chamada «nulidade de algibeira», que não é aceita pela jurisprudência pátria. (HC 895.315/RJ, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 14/5/2024, DJe de 20/5/2024.) Além disso, o indeferimento da realização da medida requerida foi devidamente fundamentado pelo Juízo de 1º Grau, com base no fato de que os policiais militares em momento algum, em juízo ou em sede policial, se referiram à deformidade na orelha do recorrente para apontá-lo como autor do fato delitivo, não tendo havido reconhecimento em sede policial ou a utilização de qualquer fotografia para identificação do apelante como base exclusivamente nesse fato, o que tornaria a diligência desnecessária. Como cediço, o deferimento de realização de diligência e de produção de provas é faculdade do juiz, no exercício da sua discricionariedade motivada, cabendo a ele desautorizar a realização de providências que considerar protelatórias ou desnecessárias e sem pertinência com a sua instrução, conforme exposto acima. Preliminar rejeitada. Passa-se ao exame do mérito. O mosaico probatório, judicializado sob o crivo do contraditório, dá conta de que, em 16 de fevereiro de 2023, após receberem notícia anônima de que 3 elementos estariam traficando drogas na região conhecida como Morro dos Cabritos, no bairro de Praça Cruzeiro, os policiais militares AILTON MONTEIRO DA SILVA JUNIOR e AILTON MONTEIRO DA SILVA JUNIOR compareceram ao local e depararam-se com o recorrente, que portava uma mochila azul, na companhia de outras pessoas não identificadas, momento em que se evadiram, sem que pudessem ser abordados. Durante a fuga, o apelante WARLEI MARINS DANTAS MENDONÇA, largou a mochila que carregava e que continha o material entorpecente, dois rádios comunicadores e 5 bases para recarga de bateria dos referidos aparelhos de rádio, sendo o apelante reconhecido facilmente pelo policial THIAGO TEIXEIRA DE SOUSA, seja porque já o conhecia por ter efetuado sua prisão em situação fática pretérita, seja porque possui uma malformação na orelha que o torna facilmente reconhecível. A materialidade delitiva vem estampada no registro de ocorrência no index 74034034, pelo auto de apreensão de index 74034036, pelo laudo de descrição de materiais de index 74034044, pelo laudo definitivo de material entorpecente/psicotrópico de index 74034043, que identificou as substâncias apreendidas como sendo 20g (vinte gramas) de cocaína (CRACK), acondicionados no interior de 20 pequenos plásticos conhecidos como «papelotes», fechados por meio de grampos metálicos e retalho de papel de cor branca com inscrições impressas na cor preta; 175 g (cento e setenta e cinco gramas) de cocaína (pó), acondicionados em 97 invólucros transparentes de plástico rígido com vedação própria, vulgarmente conhecidos como «pinos», fechados por meio de grampos metálicos e retalho de papel de cor branca com inscrições impressas na cor preta e 80 g (oitenta gramas) de maconha (Cannabis sativa L.), distribuída em 70 pequenos embrulhos feitos com retalhos de filme PVC, acondicionados individualmente em sacos plásticos transparentes, vulgarmente conhecidos como «sacolés". O tipo penal previsto no caput, da Lei 11.343/06, art. 33, é crime de natureza múltipla (multinuclear), de sorte que a prática de qualquer uma das condutas descritas no preceito primário da norma caracteriza o tráfico de drogas, dispensando presenciar atos explícitos da mercancia. A presença de expressiva quantidade da droga arrecadada em poder do recorrente pronta à comercialização no varejo, tudo na conformidade dos respectivos autos de apreensão e laudos periciais, aliado, ainda, às circunstâncias da prisão em flagrante e aos depoimentos firmes e coerentes das testemunhas policiais, tornam evidente a prática do delito previsto na Lei 11.343/06, art. 33, caput, não havendo falar-se, portanto, em conjunto probatório anêmico. Apesar da negativa do apelante, é de se registrar estarmos diante de uma condenação estruturada, que se baseou na pluralidade de elementos colhidos aos autos, caderno de provas robusto, coerente e diversificado, consubstanciado, inclusive, por autos de apreensão e laudos técnicos periciais e depoimentos dos agentes da lei. Nessa toada, devemos afastar qualquer demérito ou descrédito à palavra dos policiais da ocorrência, apenas por força da sua condição funcional. Na mesma esteira, a Súmula 70, deste E. TJERJ. ´O fato de restringir-se a prova oral a depoimentos de autoridades policiais e seus agentes não desautoriza a condenação´. De outro turno, verifica-se que não houve a produção de qualquer contraprova relevante, a cargo da Defesa (CPP, art. 156), tendente a melhor aclarar os fatos, tampouco para favorecer a situação do recorrente, ciente de que «meras alegações, desprovidas de base empírica, nada significam juridicamente e não se prestam a produzir certeza» (STJ, Rel. Min. José Delgado, 1ª T. ROMS 10873/MS). Correto o juízo de desvalor da conduta vertido na condenação que deve ser mantida, não havendo falar-se em absolvição a qualquer título. Passa-se a análise da dosimetria da pena. As penas básicas foram fixadas acima do patamar mínimo legal, em 6 anos e 3 meses de reclusão e 625 DM pelo juízo de primeiro grau. Tendo em vista a grande quantidade de material entorpecente apreendido, consistente de 20g (vinte gramas) de cocaína (CRACK), 175 g (cento e setenta e cinco gramas) de cocaína (pó), e 80 g (oitenta gramas) de maconha (Cannabis sativa L.) faz-se necessário o incremento de pena, em atenção ao disposto na Lei 11.343/06, art. 42. Contudo, a fração de aumento de 1/6 (um sexto) se mostra mais adequada ao caso concreto, em atenção aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, razão pela qual as penas-base devem ser fixadas em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário mínimo. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes ou agravantes, mantém-se a pena no patamar anteriormente fixado. Na terceira fase, ausentes causas de aumento de pena. A sentença de 1º grau aplicou o redutor a que alude a Lei 11.343/06, art. 33, § 4º em seu patamar máximo de 2/3 (dois terços), o qual deve ser mantido, estabilizando-se a pena em 1 (um) ano e 11 (onze) meses de reclusão e 194 DM. O regime semiaberto imposto pela sentença de 1º grau é incompatível com o benefício previsto no CP, art. 44, razão pela qual deve ser fixado o regime aberto para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade. Revela-se adequada e proporcional a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes de prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária. Contudo, observa-se que o magistrado não justificou a exasperação da pena pecuniária ao valor equivalente a 02 (dois) salários mínimos, razão pela qual decota-se a sanção ao patamar mínimo legal de 1 (um) salário mínimo. PRELIMINAR REJEITADA. NO MÉRITO, RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, nos termos do voto do Relator.
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