TJRJ. Apelação criminal do Ministério Público. Absolvição operada sobre os crimes de cárcere privado, ameaça, dois crimes de lesão corporal contra a mulher e descumprimento de medida protetiva. Recurso que persegue a condenação pelos crimes dos arts. 148 §1º, I e 129, §13 (16.01.2024), ambos do CP, e do Lei 11.340/2006, art. 24-A, tudo na forma do CP, art. 69, por alegada suficiência probatória, enaltecendo a palavra da vítima e a compatibilidade das lesões com as agressões por ela narrada. Mérito que se resolve em desfavor do recorrente. Imputação acusatória discorrendo que o apelado, em tese, no dia 16.01.2024, ofendeu a integridade física de sua companheira, agredindo-a com socos no tórax, e, no dia 17.01.2024, teria agredido a vítima com socos e chutes, pancadas nas suas costas e desferido golpe de faca na perna. Imputação adicional discorrendo que, desde o dia 16.01.2024, por volta das 23h, até a manhã do dia 17.01.2024, por volta de 9h30min, o réu, em tese, teria privado a liberdade de sua companheira, mediante cárcere privado, por tempo juridicamente relevante, além de ameaçado de morte. Por fim, nas mesmas circunstâncias, o réu teria descumprido a decisão que deferiu as medidas protetivas de urgência, ao entrar em contato e frequentar a residência da vítima. Relato da vítima, na DP, aduzindo que o réu ficou indignado por ela ter proibido-o de usar droga no interior de sua casa e desferiu um soco no seu tórax. Ato contínuo, a vítima disse que não aceitaria mais apanhar do réu e efetuou duas lesões em seu antebraço, com uma faca de cozinha, de modo que o acusado cessou as agressões, mas prosseguiu utilizando os entorpecentes. Afirmou que, por volta das 23h, o réu «foi ao quarto da declarante e rasgou sua vestes, dizendo que ela teria que ficar nua para não fugir de casa e trancou a porta da residência". Afirmou ter sido ameaçada de morte durante a madrugada e ter sido agredida com «pancadas nas costas e braços da declarante com um cabo de vassoura e estocou sua perna com a faca», e, após o réu adormecer, saiu de casa e chamou a polícia. Apelado que ficou em silêncio em sede policial, mas, em juízo, negou a imputação, aduzindo que pulou em cima da companheira para impedir que ela continuasse a se auto lesionar, vindo a bater com a sua cabeça, acidentalmente, no tórax da vítima e a faca acabou atingindo a perna dela. Em relação ao cárcere privado, afirmou que «trancou a porta da casa» para protegê-la, porque não sabia o que ela poderia fazer contra a própria vida e para onde ela podia ir, mas ressaltou que a porta do quarto ficou aberta, e, quando ele dormiu, deixou a chave em cima da mesa. Por fim, confirmou que tinha ciência das medidas protetivas. Depoimento da vítima, em juízo, aduzindo que ela desferiu dois cortes no próprio braço, após o réu sinalizar que usaria cocaína dentro de sua casa, motivo pelo qual o apelado a abraçou para impedir que ela passasse a faca no próprio pulso, iniciando luta corporal, momento em que ambos acabaram caindo no chão da cozinha e a faca acabou ferindo, acidentalmente, a sua perna. Vítima que relatou «que somente uma das agressões relatadas na denúncia realmente aconteceu», que foram os empurrões e «pancadas nas costas". Conjunto indiciário que, embora relevante, não mereceu o respaldo do juízo de certeza que há de incidir em casos como tais, valendo consignar, na linha do STF, que «nenhuma acusação se presume provada» e que «não compete ao réu demonstrar a sua inocência". Palavra da vítima indicando que, após o deferimento de medidas protetivas de proibição de aproximação e contato, eles se reconciliaram porque ela «quis voltar a conviver maritalmente com o acusado". Casos dos autos que impõe a manutenção da solução absolutória, ciente de que «o consentimento da vítima afasta a tipicidade do crime de descumprimento de medida protetiva» (STJ). Crimes de lesão corporal e cárcere privado que não restaram positivados. Palavra da vítima que não encontra respaldo no laudo técnico, já que as lesões apuradas não são compatíveis com as agressões que a vítima alega ter sofrido, («equimoses violáceas em antebraço direito e em lábio inferior»), decorrentes de empurrões e «pancadas nas costas". Confronto de versões parciais, cujos relatos não permite depurar, com a necessária dose de certeza, a precisa dinâmica do evento e o tempo da suposta restrição de liberdade, de modo a se estampar a imputada responsabilidade do Apelante. Conjunto probatório que, nesses termos, expõe sérias dúvidas relacionadas à comprovação de todos os elementos dos tipos imputados, suficientes para atrair o postulado do in dubio pro reo. Princípio da íntima convicção que há de ceder espaço em favor do postulado da livre persuasão racional (CPP, art. 155), devendo a conclusão estar lastreada em evidências inequívocas, ao largo de convicções pessoais extraídas a partir de deduções inteiramente possíveis, porém não integralmente comprovadas, estreme de dúvidas (STJ). Daí a sempre correta advertência de Nucci: «se o juiz não possui provas sólidas para a formação do seu convencimento, sem poder indicá-las na fundamentação da sua sentença, o melhor caminho é a absolvição". Recurso desprovido.
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