TJRJ. APELAÇÃO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. LEI 11.340/2006, art. 24-A. RECURSO DEFENSIVO QUE, PRELIMINARMENTE, SUSTENTA A INÉPCIA DA DENÚNCIA. NO MÉRITO, POSTULA A ABSOLVIÇÃO, POR FALTA DE PROVAS.
A preliminar de inépcia da denúncia não merece prosperar. Ao contrário do alegado, a denúncia atende aos requisitos do CPP, art. 41, na medida em que descreve com clareza os fatos imputados aos apelantes. A peça vestibular acusatória se apresenta escorreita, com narrativa precisa e direta, dotada dos elementos mínimos suficientes à exata compreensão da imputação, atendendo, portanto, aos fins aos quais se destina. Ademais, na esteira de firme orientação jurisprudencial da Suprema Corte, é impossível cogitar de eventual defeito da peça inaugural após a superveniência de édito condenatório proveniente de processo no qual foi garantido amplo debate acerca dos fatos delituosos denunciados e comprovados ao longo de toda instrução processual. Não há que se cogitar, portanto, em inépcia da denúncia. Razões pelas quais se rejeita a preliminar. Passa-se à análise do mérito. Emerge dos autos que no dia 25 de janeiro de 2022, o recorrente descumpriu decisão judicial prolatada no bojo do processo de 0002662-23.2021.8.19.0057, que deferiu medidas protetivas de urgência previstas na Lei 11.340/2006 em benefício de sua ex-companheira, o apelante continuou fazendo contato por aplicativo de mensagem. Contrariamente ao que alega a defesa, a prova é suficiente para ensejar um juízo de reprovação. Os relatos da vítima, tanto na delegacia quanto em juízo, são firmes e coerentes, além de corroborados pelos depoimentos da filha do casal, dando conta que o recorrente tinha plena consciência das medidas protetivas e, ainda assim, teria enviado mensagens por Whatsapp para a vítima. Em que pese uma das mensagens reproduzidas na fase de inquérito ter por destinatário a filha do apelante, é certo que outros áudios foram encaminhados diretamente para a vítima. Destaca-se que a vítima entregou algumas dessas mensagens em juízo, tendo o apelante reconhecido a própria voz nos áudios que lhe foram apresentados, confirmando a narrativa presente na inicial acusatória, de que o recorrente continuou fazendo contato com sua ex esposa em diversas oportunidades após o deferimento das medidas protetivas. Vale destacar que, nos crimes de violência doméstica e familiar, a palavra da vítima se mostra válida para ensejar um decreto condenatório, mormente quando corroborada pelos demais elementos probatórios, como no caso em tela. Nesse sentido é a jurisprudência majoritária (HC 327.231/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 17/03/2016). Destarte, o arcabouço probatório produzido se mostra robusto, suficiente e perfeitamente apto a ensejar um juízo de reprovação. No plano da dosimetria, na primeira etapa, devem ser decotadas as considerações a respeito da personalidade e conduta social, pois não encontram amparo em documentação técnico pericial. Assim, a pena base deve ser fixada no mínimo legal, qual seja, 3 (três) meses de detenção, e tornada definitiva em razão da ausência de circunstâncias agravantes ou atenuantes, ou ainda de causas de aumento ou diminuição da pena. Mantido o regime prisional aberto fixado pela sentença de 1º grau. Impossível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. O delito foi cometido no âmbito das relações domésticas, representando uma infração de médio potencial ofensivo, circunstância que não pode ser banalizada e que enseja uma resposta penal mais rigorosa. O STJ já firmou entendimento através do verbete sumular 588 no sentido de que «a prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.» Precedentes também na Suprema Corte (HC 129446, Rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, julg. 20/10/2015, public. 06-11-2015). O STJ também se pronunciou no sentido de que tal entendimento se aplica ao delito previsto no Lei 11.340/2006, art. 24-A, pois um dos bens jurídicos tutelados é a integridade física e psíquica da mulher, em favor de quem se fixaram medidas protetivas. (AgRg no HC 735.437/PR, rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julg. 7/6/2022, DJe de 10/6/2022). Cabível, no entanto, diante do montante da pena, a suspensão condicional da pena, observada a restrição prevista no CP, art. 46 (HC 440.286/RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julg. 12/06/2018, DJe 20/06/2018; (HC 307.103/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julg. 17/03/2015, DJe 25/03/2015). Sentença que se reforma para afastar a substituição de que trata o CP, art. 44, com aplicação de sursis nos moldes do CP, art. 77, pelo período de prova de 2(dois) anos, mediante as condições estatuídas no art. 78, §2º, e art. 79 ambos do CP (a) proibição de afastamento do Estado do Rio de Janeiro por período superior a 30 dias sem autorização judicial, b) comparecimento mensal em juízo, até o 5º dia útil do mês, para justificar suas atividades; c) participação em grupo reflexivo para homens autores de violência doméstica). RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
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