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DOC. 504.4537.5289.2983

TJRJ. RESPONSABILIDADE CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. TRANSFERÊNCIA FRAUDULENTA. RETENÇÃO DOS VALORES NO BANCO DESTINATÁRIO. IMPOSIÇÃO DE ABERTURA DE CONTA PARA FINS DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. CONDUTA IMPRÓPRIA. REEMBOLSO DOS VALORES INDEVIDAMENTE PAGOS. DANO MORAL MANIFESTO. VALOR REPARATÓRIO MANTIDO. HONORÁRIOS CORRETAMENTE ARBITRADO.

Das preliminares. Sustenta o apelante, inicialmente, sua ilegitimidade passiva, porquanto foi apenas o banco destinatário da transferência fraudulenta. Nosso CPC positivou duas condições genéricas para que se reconheça a existência válida de uma ação, assim expostas: a) legitimidade de parte e b) interesse processual. Salutar destacar a lição de BELINETTI ao afirmar que as condições acima são genéricas não consistindo num elenco fechado, taxativo. Em apertada síntese, são legitimados para agir, ativa e passivamente, os titulares dos interesses em conflito; legitimação ativa terá o titular do interesse afirmado na pretensão; passiva terá o titular do interesse que se opõe ao afirmado na pretensão. Em princípio, é titular da ação, apenas a própria pessoa titular do direito subjetivo material, cuja tutela pede. Desse modo, a primeira das condições da ação, a legitimidade das partes, consiste em estabelecer a pertinência subjetiva da ação, individualizando a quem pertence o interesse de agir processual, e àquele contra quem ele será exercício. Nessa toada, não há em que se falar em ilegitimidade passiva, porquanto foi o réu que reteve os valores, sendo o depositário da quantia que se almeja restituir, de forma que não há que se falar em ilegitimidade passiva. No que tange à preliminar de cerceamento de defesa, por indeferimento da prova oral, razão também não assiste ao apelante. O juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe a verificação quanto à necessidade e oportunidade para a sua produção, aferindo a utilidade da prova para formação de seu convencimento, nos termos do CPC/2015, art. 370 . In casu, verifica-se que a ação proposta pelo autor referia-se a ilegalidade na retenção de valores indevidamente transferidos, razão pela qual a prova oral, consistente no depoimento pessoal, seria desnecessária ao deslinde da controvérsia. Sendo assim, imperiosa a rejeição das preliminares. Mérito. Cogente a incidência do CDC, porquanto autor e réu inserem-se respectivamente no conceito de consumidor e de fornecedor, consagrados nos arts. 2º e 3º, caput, do CDC. Na hipótese dos autos, sustentou a parte autora que foi vítima de um golpe, tendo transferido a quantia de R$11.000,00 para terceiro, mediante depósito no banco réu. Afirma que, ao perceber o golpe, realizou o registro de ocorrência e o valor foi retido pelo banco de destino exatamente diante da suspeita de fraude. É bem verdade que, inicialmente, não houve qualquer ilícito praticado pelo réu. Contudo, verifica-se dos autos, que o réu condicionou a devolução dos valores ao autor à abertura de conta corrente, o que não se mostra lícito. Assim, é patente a obrigação da ré de indenizar, nos exatos termos do CDC, art. 14, porquanto restou incontroversa a falha na prestação do serviço, estando presentes os elementos a justificar a responsabilização civil, quais sejam, ação em sentido amplo, nexo causal e prejuízo. A parte autora foi vítima de fraude, sendo certo que o réu não poderia condicionar a devolução dos valores à abertura de conta corrente, mas apenas à ordem judicial, razão pela qual correta a determinação de reembolso dos valores. Quanto ao dano moral configura-se in re ipsa, derivando, inexoravelmente, do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provado este fato, ipso facto, está demonstrado o dano moral, numa típica presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum. Além disso, não se pode desconsiderar que, a doutrina consumeirista elaborou a teoria do desvio produtivo, segundo a qual a perda do tempo útil do consumidor decorre principalmente do fato de os fornecedores estarem, de forma voluntária e reiterada, descumprindo as regras legais com o intuito de otimizar o lucro em prejuízo da qualidade do serviço. Assim, por exemplo, fornecedores de produtos e serviços violam os prazos para troca dos bens defeituosos ou só promovem sua substituição após a propositura de ações judiciais. Decerto, essa conduta dos fornecedores de produtos e serviço ofende os deveres anexos ao princípio boa-fé, sendo essa a hipótese dos autos. Dano moral configurado. Quantum arbitrado compatível com a expressão axiológica do interesse jurídico violado, na perspectiva de restaurar o interesse violado, obedecidas a razoabilidade, proporcionalidade, equidade e justiça, atendendo as funções punitiva, pedagógica e compensatória. Por fim, não há que se falar em redução dos honorários advocatícios, porquanto já fixado percentual no mínimo legalmente previsto. Preliminares rejeitadas. Desprovimento do recurso.

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