TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE LATROCÍNIO E DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. COMPROVAÇÃO. DOSIMETRIA. 1)
Ao depor em juízo, sob o crivo do contraditório, policiais civis narraram que estavam em patrulhamento nas proximidades quando, alertados por populares, diligenciaram ao local dos fatos e encontraram a vítima ¿ motorista de aplicativo ¿ caída morta na estrada de terra batida e, alguns metros mais à frente, o automóvel acidentado junto a uma cerca; no interior ensanguentado do veículo, encontraram, no assoalho, uma faca banhada de sangue. Segundo os policiais, populares na ocasião lhes contaram a dinâmica dos fatos, informando terem visto o corpo da vítima sendo jogado do automóvel e o condutor se evadir para um matagal após perder a direção do veículo. Com isso, realizaram uma varredura na área e localizaram uma mochila contendo três telefones celulares, uma espingarda e uma blusa preta. Ainda de acordo com os policiais, ao seguirem a descrição física fornecida pelos populares, souberam que o criminoso em fuga solicitara mais adiante a carona de um mototaxista. Localizado o mototaxista, este identificou o réu e, destarte, rumaram para seu endereço, onde o encontraram na varanda da residência. O réu ¿ prossegue o relato ¿ rendeu-se de imediato, colocando as mãos na cabeça, e confessou o crime, passando a detalhá-lo. Disse que tinha a intenção de roubar o veículo para impressionar uma namorada e que por duas vezes já havia tentado cometer o delito, mas somente adquiriu coragem após o incentivo do irmão, munindo-se, então, da faca e da espingarda; contudo, em determinado ponto do trajeto, ao perceber que o motorista pressentira o roubo, passou a golpeá-lo no pescoço com a faca, jogou o corpo para fora e assumiu a direção do veículo, mas não conseguiu controlá-lo e, após poucos metros, colidiu com uma cerca à margem da estrada. Os policiais também disseram que o pai do réu, na ocasião na abordagem ao filho, reconheceu como sendo sua a faca utilizada no crime. 2) Os depoimentos mostraram-se seguros e congruentes, afinando-se inclusive com as declarações anteriores prestadas em sede extrajudicial, e merecem, à míngua de prova em contrário, total prestígio, a teor da Súmula 70 da Corte. Seria incoerente permitir aos agentes, afetos aos princípios da moralidade e impessoalidade administrativas, atuar em nome do Estado na repressão criminal e, por outro lado, desmerecer suas declarações quando chamados para contribuir com a reconstrução do fato probandum. Ao amparo do princípio da persuasão racional, somente se mostra razoável desacreditar tal prova quando contraditória, inverossímil, dissonante com os demais elementos dos autos ou quando pairarem dúvidas concretas acerca da idoneidade e imparcialidade dos depoentes ¿ o que não se vislumbra no caso em apreço. 3) Não há qualquer nódoa no depoimento dos policiais de sorte que não possam ser também valorados como testemunho indireto, suprindo o depoimento daqueles que informalmente lhes prestaram informações escusando-se de se apresentar para depor. Decerto não se descura que os testemunhos de ¿ouvir dizer¿ (hearsay testimony) devem ser recebidos com as devidas reservas, em especial quando inexistem outros elementos a dar-lhes respaldo. Contudo, no caso em análise, o próprio réu e seu pai ¿ conquanto silentes em juízo ¿ ao serem ouvidos em delegacia no dia seguinte ao crime corroboraram por completo os testemunhos. O réu confessou o latrocínio em pormenores, de forma coerente com a dinâmica relatada aos policiais pelas testemunhas presenciais. Também em delegacia, o pai do réu confirmou que a arma utilizada no crime ¿ uma ¿faca de limpar peixe¿ ¿ lhe pertencia, bem como que ao filho pertencia a mochila arrecadada na cena do crime. Ainda, o pai do réu disse haver presenciado o momento em que o réu chegou em casa muito sujo de lama bem como o momento em que confessou o delito de maneira livre e espontânea aos policiais civis. 4) Inexiste óbice a que elementos informativos sirvam para formar o convencimento do juízo quanto à autoria delitiva. O que se inadmite, em obséquio ao contraditório e à ampla defesa, é que sejam os únicos dispostos à apreciação do magistrado, de sorte a embasar com exclusividade seu convencimento ¿ não é esse, porém, o caso dos autos. 5) Inexistem pesos distintos e predeterminados entre as circunstâncias judiciais elencadas no CP, art. 59, cujos conceitos, sob muitos aspectos, se sobrepõem e se interpolam. O julgador possui discricionariedade vinculada para fixar a pena-base, devendo proceder ao respectivo aumento, de maneira fundamentada, à luz do caso concreto, em função do maior juízo de censura atrelado às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas do agente, vedado apenas o bis in idem. Na espécie, o aumento efetuado pelo juízo a quo na fração de 1/5 (um quinto) ¿ um pouco acima do que ordinariamente propugnado pela jurisprudência para cada vetorial do CP, art. 59 ¿ encontra-se justificado em função da exacerbada culpabilidade do réu, evidenciada pela motivação (o réu queria ter a posse de um automóvel para impressionar uma pretensa namorada) e pela extrema violência na execução do crime, praticado com excesso de execução (a vítima levou treze golpes de faca no pescoço). Além disso, como bem observado pelo magistrado, o réu fingiu-se de passageiro de uma corrida de aplicativo, com destino até localidade erma, o que dificultou a defesa da vítima, que permaneceu vulnerável, de costas para o seu algoz. Na segunda fase do critério trifásico, ao contrário do que alegado pela defesa, o magistrado reconheceu a atenuante da confissão espontânea, o que fez com que, juntamente com menoridade relativa, retrocedesse a reprimenda do crime de latrocínio para o mínimo legal. Desprovimento do recurso.
Não perca tempo. Cadastre-se e faça agora sua assinatura ADM Direito