TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO ALMEJANDO, PRELIMINARMENTE, O RECONHECIMENTO DA NULIDADE DO FLAGRANTE E DO PROCESSO POR VIOLAÇÃO DOMICILIAR E QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA. NO MÉRITO, REQUER A ABSOLVIÇÃO POR FRAGILIDADE PROBATÓRIA OU, SUBSIDIARIAMENTE, O RECONHECIMENTO DO PRIVILÉGIO PREVISTO NO art. 33, §4º DA LEI DE DROGAS, COM O ABRANDAMENTO DO REGIME PRISIONAL AO ABERTO E A SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVAS DE DIREITOS.
Assiste razão à defesa. Extrai-se dos autos que, no dia 15/10/2018, policiais militares em serviço receberam informe no sentido de que o apelante, que já seria conhecido pelo envolvimento com o tráfico de drogas, recebera uma carga de drogas que estaria guardada em sua casa. Os agentes, então, procederam até o endereço e entraram na residência, onde encontraram Luiz Miguel deitado na cama e coberto com um lençol. Afirmaram que a porta estava aberta e que foram em direção ao réu, que não quis se levantar. Em revista ao local, localizaram parte do entorpecente na cama e o restante ao redor da casa, em meio aos arbustos. O laudo de exame de entorpecentes atestou a apreensão total de 41,27g de cocaína, além 14 frascos contendo solvente organoclorado. In casu, não há dúvida quanto à materialidade. A questão dos autos nos remete ao exame quanto a validade do obtido como meio de prova, em especial sob o viés das teses paradigmáticas firmadas pelo STJ e STF, que propuseram novas balizas para o ingresso no domicílio de suspeitos de infrações, ainda que de crimes permanentes. Com efeito, o ordenamento jurídico pátrio determina que a regra é a inviolabilidade do domicílio e que a busca, seja ela pessoal ou domiciliar, exige fundada suspeita autorizando-a, ex vi dos arts. 5º, XI, da CF/88 e 240, § 1º do CPP. Sob tal prisma, o Supremo Tribunal Federal já havia adotado, no julgamento com repercussão geral do RE Acórdão/STF (Tema 280 - Tribunal Pleno, Rel. Ministro Gilmar Mendes, em 5/11/2015) o entendimento de que: «A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito (...)". Em 02/03/2021, a Sexta Turma do STJ, no emblemático julgamento do HC 598051/SP, adotou criterioso posicionamento, disciplinando que o flagrante delito somente poderia excetuar a garantia de inviolabilidade do domicílio quando se traduzir em verdadeira urgência, salientando que «o mandado é o caminho mais acertado a tomar". Não se desconhece que, no dia-dia das diligências policiais, muitas vezes os agentes da lei se veem diante de situações que reclamam uma atuação rápida, para coibir a prática de crimes ou colher provas. Em tais hipóteses, a Constituição autoriza o ingresso em um domicílio mesmo sem a mencionada autorização judicial. No caso dos autos, o que se tem é um informe recebido pela guarnição e a narrativa de que o apelante já seria conhecido por seu envolvimento com o tráfico. Chegando ao endereço de sua residência, os agentes não efetuaram qualquer observação prévia nem constataram eventual movimentação estranha ou outro fato que chancelasse a entrada. Já dentro do local, ainda revistaram o apelante, o imóvel e uma área de mato atrás do terreno, onde relataram encontrar o restante do entorpecente. Ora, se existiu indicação de possível tráfico de drogas na residência do apelante e a ida ao local não tinha o escopo de efetuar investigações - constando dos autos que os policiais entraram diretamente na residência -, a medida acertada seria pleitear ao judiciário, que funciona ininterruptamente no Estado, a expedição do competente mandado de busca e apreensão. Portanto, a opção feita pelos agentes contamina a prova colhida nos autos, sendo forçoso se declarar ilicitude, hipótese que afeta o próprio gravame condenatório, conduzindo a absolvição do apelante. RECURSO DEFENSIVO PROVIDO, para acolher a tese de nulidade da prova obtida e ABSOLVER O APELANTE, nos termos do art. 386, VII do CPP.
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