TJRJ. HABEAS CORPUS. CP, art. 215. IMPETRAÇÃO QUE ALEGA CONSTRANGIMENTO ILEGAL EM RAZÃO DA NULIDADE DA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO POR CERCEAMENTO DE DEFESA E INDUZIMENTO DA VÍTIMA.
Conforme consta da inicial acusatória, no dia 30/11/2022, o paciente, na qualidade de médico da Clínica da Cidade, passou a questionar a paciente que se sujeitaria a exame de ultrassonografia transvaginal e das mamas, «com perguntas capiciosas, de cunho íntimo, invasivas e inadequadas, enquanto se acomodava ao sentar ao lado da vítima, encostando seu corpo no dela enquanto deitada na maca, momento em que, sob o argumento que iniciaria o exame, começou a alisar sua vagina. Ato contínuo, ainda sob o pretexto de que estaria realizando o exame, o acusado passou a introduzir e retirar o transdutor do Ultrassom, simulando o coito. Terminado a ultrassom transvaginal, passou à realização do exame de Ultrassonografia das mamas, momento em que passou a acariciar os seios da vítima e, respirando de forma ofegante, demonstrou estar sentindo prazer e, se posicionou sobre a vítima, de modo que, enquanto apalpava seus seios, encostava um dos cotovelos na sua vagina e, simultaneamente, esfregava as mãos em seu corpo e órgão genital (pênis)". Em 21/11/2023, no curso da ação penal, foi realizada a audiência de instrução e julgamento, conforme assentada de fls. 197/198 do anexo 1, em que foram ouvidas a vítima M. R. C. as testemunhas J. C. G. N. E. M. C. e E. L. A. Sustentam os impetrantes a ocorrência de vício na realização da citada AIJ. Destacam que houve cerceamento da defesa pela magistrada de primeiro grau porque teriam sido impedidos de prosseguir com seus questionamentos, com o argumento acerca da proteção da vítima nos moldes da Lei Mariana Ferrer, o que não se revelaria justificativa plausível. Afirmam que, em razão de a vítima ter mencionado a presença de seu companheiro no desenrolar dos fatos, isso o tornaria testemunha crucial para o deslinde do contexto em apreço. No curso da oitiva da vítima, a Defesa chega a questionar se marido da vítima tinha noção sobre os fatos, ao que esta respondeu que seu marido não teria qualquer conhecimento em relação ao crime contra ela perpetrado. Por fim, a Defesa encerra seus questionamentos nos seguintes termos por ela transcritos «Eu explico. Aliás, não (...) sem mais perguntas, Excelência, não tem como fazer perguntas.». Além disso, a Defesa afirma que a leitura do depoimento da vítima em audiência pelo membro do Ministério Público a teria induzindo a ratificar todas a suas declarações anteriores. Ao contrário do alegado pelos impetrantes, no caso em tela não houve qualquer cerceamento de defesa, tendo sido plenamente possível o exercício da defesa técnica por parte dos patronos do paciente. A pergunta formulada reiteradamente pela Defesa e negada pelo juízo a quo dizia respeito ao conhecimento, pelo marido da vítima, dos fatos, o que foi respondido negativamente por esta nos seguintes termos, transcritos pelos próprios impetrantes: «Acabei de dizer que não. Se o Afonso soubesse ele teria matado ele. Imagina sua esposa chegar para você e dizer eu fiz um exame ginecológico e ele me abusou". A negativa restou devidamente fundamentada pelo juízo apontado como coator, o qual destacou que a insistência em formulação de pergunta já respondida deve ser reputada como ato meramente revitimizador. Além disso, o juízo de conveniência para aferir se a oitiva de determinada testemunha é ou não pertinente, cabe ao magistrado. Nesse sentido a Jurisprudência do E. STJ (AgRg no AREsp. Acórdão/STJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 18/4/2023, DJe de 5/5/2023.). No caso dos autos, como bem destacou a magistrada, a vítima descreve que seu marido sequer presenciou os fatos, não tendo a defesa apresentado qualquer fundamento relevante para sustentar que a ausência de oitiva do mesmo tenha acarretado prejuízo ao paciente. Do mesmo modo, não há qualquer vedação legal acerca da leitura da leitura de depoimento prestado em sede policial ou da denúncia para as testemunhas antes da oitiva destas, desde que ausente comprovação de efetivo prejuízo para a parte. Destaca-se que o art. 204, parágrafo único, do CPP, autoriza a breve consulta a apontamentos até mesmo durante a oitiva, de forma que a leitura de depoimento prestado em sede policial ou da denúncia não pode ser vista como causa de nulidade da oitiva de testemunhas. A jurisprudência do E. STJ caminha nesse sentido (AgRg no AREsp. Acórdão/STJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de 29/11/2022.). Ademais, o princípio pas de nullité sans grief, fundamentado no CPP, art. 563, consiste em que nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. Não se verifica, pois, qualquer constrangimento ilegal a ser sanado por esta via heroica. ORDEM CONHECIDA E DENEGADA.
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