Carregando…

DOC. 771.4242.3592.1619

TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 148, §1º, I, ART. 344 C/C art. 61, II, ALÍNEA «F» E ART. 147 C/C ART. 61, II, ALÍNEA «F», TODOS DO CÓDIGO PENAL, N/F DO CODIGO PENAL, art. 69. RECURSOS DO MP E DA ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO PELA REFORMA DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA, COM VISTAS Á CONDENAÇÃO DO APELADO, COMO PROPOSTA NA DENÚNCIA.

Segundo a denúncia, no dia 1º de julho de 2019, por volta 11h15, na BR-101, bairro Boa Vista, São Gonçalo, o apelado e mais dois comparsas privaram sua ex-companheira de sua liberdade mediante sequestro. Nesse evento, teria sido usada grave ameaça com o intuito de constrangê-la, em interesse próprio do apelado e do irmão dele, José Leonardo, em inquéritos policiais onde ambos seriam investigados por crimes cometidos contra a vítima. No dia 04 de julho de 2019, por volta de 18h47, teria ameaçado a vítima de morte. A dinâmica teria sido a seguinte: no dia dos fatos, a vítima estava dirigindo pela BR-101, na altura do bairro Boa Vista, São Gonçalo, quando dois indivíduos não identificados em uma motocicleta a abordaram, empunhando uma pistola, exigindo que parasse o veículo. Em seguida, um dos indivíduos entrou, mandando que seguisse até o bairro Guaxindiba, enquanto o outro seguia o veículo, conduzindo a motocicleta. No acesso ao bairro Jacaré, o indivíduo que estava no veículo com a vítima pegou o celular desta e arrancou o chip Nextel do aparelho telefônico. Nesse momento, ele disse ter três avisos para a vítima: o primeiro, era abandonar tudo contra seu ex-marido, o ora apelado, referindo-se aos registros de ocorrência que realizou contra ele; o segundo, para também desistir do processo contra o irmão do recorrido e, por fim, para que a vítima entregasse o documento de compra e venda da residência situada à Rua Arlindo Batista de Paula, para o genitor do apelado. Segundo a vítima, o indivíduo durante toda a abordagem falava ao telefone, como se recebendo instruções de alguém sobre como agir. Dias depois, em 04/07/2019, através do aplicativo de mensagens WhatsApp, a vítima recebeu mensagem dizendo: «EU VOU TE MATAR ONDE EUBTE (sic) ACHAR», «SOME DE SÃO GONÇALO», «E SE ME PEDI (sic) PENSÃO MATO VOCÊ E NATHALIA», referindo-se, inclusive, ao sequestro praticado, ao dizer que «essa semana foi só um toque da próxima vez te encho de tiro», exigindo a entrega do documento da casa, tal como mencionado pelo indivíduo que a sequestrou. Conhecido o caderno das provas e o que mais consta dos autos, é inegável que em se tratando de crimes cuja gênese seja a relação doméstica ou familiar, o que alberga a condição de ex-companheira que circunstancia a vítima, a sua palavra ganha diferenciada relevância quando da sua consideração em Juízo. Nesse sentido, inclusive, singra a melhor doutrina e jurisprudência, quando finalmente reconhecida a vulnerabilidade da mulher nas ocasiões em que se vê sujeita à repugnante violência pela condição de gênero, incrementada pelo contexto da relação doméstica, através de tratamentos condenáveis, que transitam desde as agressões físicas até outras, de índole variada mas igualmente abjetas, como são as agressões morais, materiais e intelectuais, inclusive. Contudo, essa presunção de veracidade que milita a favor da palavra da ofendida não é absoluta e nem mesmo sobrepaira incólume e inatingível por todas as exigências formais e materiais de um processo penal, por exemplo. Em se tratando de uma presunção juris tantum, deve ser amparada em algum conjunto probatório que guarneça de maneira lógica, geográfica, temporal e residual a pretensão eventualmente deduzida, fornecendo algum liame que interligue e permita visualizar a correlação triangular entre autor, fato lesivo e vítima. No caso concreto, o exame do caderno das provas e mais o que dos autos consta não permite a formação da precitada correlação a atribuir alguma responsabilização penal àquele inicialmente imputado, o ora recorrido, ressaltando-se que os fatos a ele atribuídos podem, sim, muito possivelmente ter ocorrido, exatamente ou até com mais intensidade ainda do que na forma como narrada. Porém, na seara judicial, restaram incomprovados no quesito basilar da autoria, razão pela qual a sentença objurgada deve ser mantida por suas próprias e jurídicas razões. RECURSOS CONHECIDOS E. DESPROVIDOS, na forma do voto do Relator.

(Origem do acórdão e Ementa p/citação - Somente para assinantes ADM Direito)
Não perca tempo. Cadastre-se e faça agora sua assinatura ADM Direito