Carregando…

DOC. 254.4016.6308.8583

TJRJ. Apelação criminal defensiva. Condenação pelo crime de estupro de vulnerável contra enteada menor de 14 anos. Recurso que busca a solução absolutória, por fragilidade do conjunto probatório e, subsidiariamente, a revisão da dosimetria, para que a pena-base seja fixada no mínimo legal e, na fase intermediária, seja afastada a agravante do CP, art. 61, II, «f», por configurar bis in idem sua aplicação de forma concomitante com a majorante do CP, art. 226, II. Mérito que se resolve em desfavor da Defesa. Materialidade e autoria inquestionáveis. Instrução revelando que o réu, padrasto da vítima, praticou com esta (que contava com 09 anos de idade) ato libidinoso consistente em lamber a genitália dela enquanto se masturbava, sendo a ação flagrada pela genitora da menor e acionada a polícia militar. Natureza da imputação que, à luz dos seus específicos contornos fáticos, se classifica como daquelas que não costumam deixar vestígios, considerando que a prática libidinosa se posta no átrio do simples contato sexual, independentemente de quaisquer sinais exteriores aparentes, razão pela qual a prova da existência material do injusto tende a se perfazer pela análise de todo o conjunto probatório (Mirabete), afastando, pois, a incidência estreita do CPP, art. 158. Firme diretriz do Supremo Tribunal Federal e STJ sublinhando que, «nos crimes contra os costumes, a palavra da vítima assume preponderante importância, se coerente e em consonância com as demais provas coligidas nos autos". Palavra da Vítima, no caso, bem estruturada e contextualizada, estando ressonante nos demais elementos de convicção. Testemunhal acusatória, notadamente o relato da mãe da vítima, que presenciou os fatos, ratificando a versão restritiva. Réu que optou pelo silêncio na DP e em juízo. Ausência de qualquer contraprova produzida a cargo da Defesa (CPP, art. 156). Muito distante do salientado pela Defesa, não há, na espécie, sequer de longe, qualquer motivo concreto, mínimo que seja, para descredenciar ou desprestigiar o teor dos relatos da vítima e de sua mãe. Saliente-se que o processo 0011812-08.2015.8.19.0067, relacionado a pedido de medidas protetivas de urgência formulado pela vítima, representada por sua genitora, em razão de suposta prática de crime semelhante ao presente pelo pai dela, e os relatórios técnicos nele acostados, não têm o condão de, por si só, infirmar o acervo probatório reunido nos presentes autos, sobretudo por se tratar de fatos e contextos distintos, separados por considerável lapso temporal. Outrossim, apesar do suscinto depoimento prestado pela vítima em juízo, não se sustenta a alegação de que ela «demonstra desconhecimento sobre os fatos". Conforme muito bem realçado pelo Parquet em suas contrarrazões, a vítima «demonstrou os traumas psicológicos gerados pelo crime, pois, ao tratar do assunto, fica desconfortável e tem dificuldade de abordá-lo. Por tal razão, em seu depoimento especial, a ofendia limitou-se a dizer que os fatos ocorreram na casa de sua mãe, mas que não se lembra em que parte da residência, bem como se havia mais alguém no local. Os abalos sofridos pela criança são tão notórios que, ao ser indagada sobre os fatos, permanece quase silente e se mostra retraída. Contudo, às questões sobre seus gostos pessoais, a ofendida respondeu que gosta de judô e jiu-jitsu e, sorrindo, contou que é faixa amarela no primeiro esporte, o que denota a angústia que o evento criminoso lhe gerou.» Em circunstâncias como tais, não há espaço para suposições ou especulações em torno desse tema, merecendo afago jurisdicional a orientação que prestigia a higidez acusatória, emoldurada por prova segura, sedimentada na palavra da vítima, corroborada pela testemunhal acusatória. Conjunto probatório hígido, apto a respaldar a solução condenatória, evidenciando-se o crime de estupro de vulnerável, o qual não admite relativização. Preceito protetivo de caráter absoluto que, tanto sob a égide da lei anterior, quanto pela incriminação hoje vigente, se posta «como instrumento legal de proteção à liberdade sexual da menor de quatorze anos, em face de sua incapacidade volitiva» (STJ), «sendo irrelevantes, para tipificação do delito, o consentimento ou a compleição física da vítima» (STF). Fato que, assim, reúne todos os elementos do CP, art. 217-A Majorante prevista no CP, art. 226, II corretamente reconhecida, tendo em vista que o réu, ao tempo dos fatos, ostentava a condição de padrasto da vítima. Juízos de condenação e tipicidade ratificados (art. 217-A c/c art. 226, II, ambos do CP). Dosimetria que não tende a ensejar reparo. Idoneidade da negativação da pena-base, em razão da idade da vítima (09 anos), ciente de que «o delito em questão (estupro de vulnerável) está caracterizado quando cometido contra pessoa menor de 14 anos, o que significa que ele pode ser praticado contra crianças e adolescentes. Quando praticado contra os mais precoces física e psiquicamente, ou seja, os mais vulneráveis, evidencia-se uma maior reprovabilidade da conduta do agente, de forma a autorizar o recrudescimento da basilar» (STJ). Igualmente correto o reconhecimento da agravante prevista no CP, art. 61, II, «f». Orientação do STJ no sentido de que «[n]ão caracteriza bis in idem a utilização da agravante genérica prevista no CP, art. 61, II, f e da majorante específica do CP, art. 226, II, tendo em vista que a circunstância utilizada pelo Tribunal de origem para agravar a pena foi a prevalência de relações domésticas no ambiente intrafamiliar e para aumentá-la na terceira fase, em razão da majorante específica, utilizou-se da condição de padrasto da vítima, que são situações distintas". Inviabilidade da concessão de restritivas (CP, art. 44) ou do sursis (CP, art. 77), ante a ausência dos requisitos legais. Regime prisional fechado aplicado, o qual se revela «obrigatório ao réu condenado à pena superior a oito anos de reclusão. Inteligência dos arts. 59 e 33, § 2º, do CP» (STJ). Tema relacionado à execução provisória das penas que, pelas novas diretrizes da jurisprudência vinculativa do Supremo Tribunal Federal (ADCs 43, 44 e 54), não mais viabiliza a sua deflagração a cargo deste Tribunal de Justiça, preservando-se, si et in quantum, o estado jurídico-processual atual referente ao Acusado (réu solto). Desprovimento do recurso defensivo.

(Origem do acórdão e Ementa p/citação - Somente para assinantes ADM Direito)
Não perca tempo. Cadastre-se e faça agora sua assinatura ADM Direito