DECRETO 23.501, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1933
(D. O. 27-11-1933)
O Chefe do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, usando das atribuições que lhe confere o art. 1º do Decreto 19.398, de 11/11/30, e
Considerando que é função essencial e privativa do Estado criar e defender sua moeda, assegurando-lhe o poder liberatório;
Considerando que é atribuição inerente à soberania do Estado decretar o curso forcado do papel moeda, como providência de ordem pública;
Considerando que, uma vez conferido ao papel moeda o curso forçado, não pode a lei que o decretou ser derrogada por convenções particulares, tendentes a ilidir-lhe os efeitos, estipulando meios de pagamento que redundem no repúdio ou na depreciação desta moeda, a que o Estado afiançou poder liberatório igual à metálica;
Considerando que o § 1º do art. 947 do Código Civil, como disposição geral destinada á perpetuidade, não colide com a existência, por sua natureza transitória, do curso forçado, mas enquanto este perdura não pode aquele ser aplicado:
Considerando que em quase todas as nações tem sido decretada a nulidade da cláusula ouro e de outros processos artificiosos de pagamento, que importem na repulsa ao meio circulante;
Considerando que, além dos países cujos sistemas monetário sofreram profundo abalo, pela desvalorização quase total de sua moeda fiduciária, a França, a Inglaterra e os Estados Unidos adotaram rigorosas medidas, entre as quase muitas das abaixo prescritas, para evitar, ou sustar, a depreciação de sua moeda papel;
Considerando que em França, mesmo antes da lei de 25 de junho do 1928, a jurisprudência, desde 1873, se firmara pela nulidade da cláusula ouro, por contrária à ordem pública, no regime do curso forçado, exceto para os pagamentos internacionais, como se deduz e verifica dos arestos da Côrte de Cassação, de 11/02/1873, 7 de junho de 1920, 23 de janeiro de 1924, 9 de março de 1925, 15 de abril de 1926, 17 de maio de 1927 e 13 de junho de 1928;
Considerando que também se manifesta contrária à cláusula ouro a jurisprudência inglesa, cujo aresto mais recente é da Court of Appeal de Londres, que, em abril do ano corrente, mantendo a sentença da High Court of Justice, no caso Feist v. The Company, decidiu que a Société Belge d¿Eletricité poderia pagar «em qualquer moeda legal » as suas obrigações de 100 libras, declaradas nos títulos «libras peças de ouro esterlino da Inglaterra, iguais ou equivalentes em peso de ouro fino às de 1/09/1928 »;
Considerando que os Estados Unidos, pela Joint Resolution, sancionada a 6 de junho último, declaram nula qualquer cláusula que faculte ao «credor o direito de exigir o pagamento em ouro ou determinada espécie de moeda ou em soma equivalente de dinheiro dos Estados Unidos, calculada sobre tal base », e determinaram que «qualquer obrigação anteriormente contraída, embora nela se contenha semelhante disposição, será resgatada pelo pagamento dólar por dólar, em qualquer moeda metálica ou papel de curso legal »;
Considerando que providências dessa natureza, tomadas pelo Estado no exercício de suas funções soberanas, e por altas razões de ordem pública, não podem deixar de abranger nos seus efeitos as convenções anteriores à publicação da lei;
Considerando que é geral a retroatividade de tais medidas, como se verifica da Joint Resolution supra-citada; do decreto alemão de 28/09/1914, quando prescrevi que «as convenções celebradas antes de 34/07/1914, e pelas quais o pagamento devia ser efetuado em ouro, cessam até nova ordem de obrigar as partes »; do Decreto belga de 2/08/1914; da Lei Rumena de 21/12/1916; da Lei Grega de 21/07/1914; da Lei Búlgara, de 12/05/1921, e do Decreto Francês, de 18/09/1790, que assim dispunha: «todas as somas por estipulação pagáveis em espécie poderão ser pagas em assinados ou promessas de assinados, não obstante todas as cláusulas ou disposições em contrário »;
Considerando, portanto, que não pode ter validade legal, no território brasileiro, qualquer cláusula, convenção ou artifício, que vise subtrair o credor ao regime do papel moeda de curso forçado, recusando-lhe ou diminuindo-lhe o poder liberatório integral, que o Estado em sua soberania lhe conferiu;
Considerando que o contrário seria admitir a possibilidade de convenções de Direito Privado derrogarem leis de Direito Público: Decreta:
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